Nesta 5ª feira (14.dez.23), dezenas de artistas foram à Câmara dos Vereadores de Campo Grande denunciar o calote de Adriane Lopes (PP), aos editais culturais, e cobrar apoio para reverter a previsão orçamentária de apenas R$ 4 milhões para editais em 2024. Esse é 3º ato em busca de direitos adquiridos.
- 1º ATO - leia: Adriane Lopes recebe manifestantes, assume calote na cultura e repete estratégia de Trad
- 2º ATO - leia: Prefeitura lança 'fake news de R$ 8,8 milhões' para 'apagar' calote
A sessão, que teve início às 9h, foi tensa desde o princípio, pois os vereadores da base da prefeita não gostaram de cartazes em que os agentes da cultura se referiam ao não cumprimento dos editais de 2022 e 2023 (FMIC, FOMTEATRO e Prêmio Ipê) como um “calote”.
"Acredito que falar calote, corrupção não acrescenta. Tenho membros da minha família que faz parte da cultura", reclamou Beto Avelar, da base da pepista.
VEREADOR FRICOTEIRO
Outro parlamentar, Tiago Vargas (PSD), fez fricote segurando uma Carteira de Trabalho, atacando os trabalhadores da cultura, sugerindo que os agentes buscassem empregos em órgãos trabalhistas formais. Além disso, fez ataques pessoais a artistas presentes no plenarinho.
“Falta de respeito, machismo. Porque viu que eu tenho pelos nos braços fez um sinal mandando retirar, fazendo insinuações desrespeitosas. Sem contar a falta de respeito que ele tem com a gente, artista, falando que a gente precisa de trabalho. Nós somos trabalhadores, fazemos cultura! Cultura para mim não é festa de rena, não é isso que essa prefeita está fazendo, não. E se ele não consegue reconhecer isso, ele é um babaca, misógino, machista e não respeita nossa cultura”, protestou a artista visual Thalya Veron.
Extremista de direita e bolsonarista, desde o início, Tiago atuou para que a sessão fosse interrompida. Para isso, o legislador fez ofensas direitas com joguetes e aceno ofensivos aos presentes. Além disso, propagou fake news, dizendo que a Lei do 1% para a Cultura foi vetada pela ex-presidente Dilma Roussef, apesar de a mesma nunca ter sido prefeita em Campo Grande. A lei em questão, na verdade, foi considerada inconstitucional em 2015, durante a gestão de Alcides Bernal.
A equipe do TeatrineTV registrou em vídeo o momento em que Tiago ofende os populares da classe artística presentes na Casa de Leis. Eis o vídeo:
O QUE COBRAM OS TRABALHADORES DA CULTURA?
A presidente do Fórum de Cultura, Romilda Pizani, falou em nome dos artistas explicando a situação para os legisladores. “Precisamos de todos vocês vereadores para contribuir com que essa gestão municipal publique nosso edital com valor de R$ 8 milhões de reais. Temos uma defasagem com relação aos editais no valor de R$ 4 milhões. Foi aprovado nesta Casa um acréscimo de R$ 2 milhões para contribuir com a cultura, mas esse valor também não atende a classe artística de Campo Grande, que chega a um milhão de habitantes. Estamos aqui para reivindicar esse direito", introduziu.
Os valores citados por Romilda, referem-se ao Fundo Municipal de Investimentos Culturais (Fmic) e do Programa Municipal do Teatro (Fomteatro), além do Prêmio Ipê, que contempla 6 linguagens artísticas. Esses três mecanismos de fomento o foram descontinuados nos dois anos de gestão de Adriane Lopes.
"Na região mais periférica da cidade nós levamos a cultura para essas regiões. Os eventos de entretenimento são importantes, mas mais importante do que entretenimento é trabalhar a política pública de cultura de forma contínua. Essa gestão tem que entender que precisamos de mais recursos para fomentar a cultura no município, para criar público para a cultura de Campo Grande, para que todos tenham acesso. Precisamos desse dinheiro para fazer cultura para o povo, com base na Lei. Esse valor não nos atende, viemos de um déficit cultural, estamos pedindo R$ 8 milhões, mas teria que ser R$ 12 milhões para cultura. Não vamos aceitar calote”, acrescentou Romilda.
Logo em seguida, o presidente abriu espaço para comentários dos vereadores e foi nesse momento que o vereador fricoteiro, Tiago Vargas, desferiu ofensas aos trabalhadores da artes. Romilda teria 3 minutos para responder aos legisladores, mas acabou sendo interrompida pelo próprio presidente da Casa de Leis, Carlão Borges, após cobrar uma responsabilização aos atos do vereador fricoteiro.
“Isso é o que nós temos de poder público no município de Campo Grande. É exatamente contra isso que estamos lutando. Estamos aqui para reivindicar os nossos direitos de trabalhadores dentro da casa que deveria ser do povo, onde leva o slogan: Casa do Povo, porém não é! Nós tivemos nessa sessão vereador não reconhecendo a nossa atividade como uma atividade de trabalho e não há nesta Casa, um regimento de punição para esses vereadores. Apresentam apenas uma advertência, sendo que esse mesmo vereador pode entrar tripudiar na sessão em cima do povo, não dá! Então, esse cerceamento da fala, é algo presente em Campo Grande só na parte do povo, não queremos mais que nossa voz seja calada”, disse a representante.
Com isso, a participação da classe cultural na sessão foi encerrada. Carlão chegou a desculpar-se por ter cortado a fala de Romilda, alegando que estaria tentando evitar um novo conflito com o vereador fricoteiro. "Fui duro com ela, peço desculpas, mas na presidência temos que ter o controle e poderia ter o contraponto do vereador. Ela tem oportunidade de falar quando quiser. Sou a favor da cultura. Toco meu violão e tenho cinco sanfonas", argumentou Carlão.
"FALTA VONTADE POLÍTICA"
Um dos apoiadores da Cultura na Casa de Leis campo-grandense, o vereador Ronilço Guerreiro comentou o porquê de mesmo a cidade tendo superávit, Adriane Lopes não paga os editais.
“Falta vontade política mesmo de atender. As pessoas têm que entender que cultura não é gasto, é investimento num futuro melhor. Cultura gera emprego. É uma cadeia econômica é muito importante! Cultura para mim não é só entretenimento, que é gostoso, é bonito, mas não é só isso. Eu penso que se eu fosse secretário de cultura um dia, eu iria dividir: 50% do orçamento da cultura seria só para editais e fomento, para fazer que recursos cheguem na ponta; os outros 50% seriam para manutenção de custeio, eventos institucionais como Cidade do Natal, Carnaval, que é muito importante, mas acredito que grande parcela do orçamento da Cultura deveria ser para editais e fomentos. E digo mais, o secretário que assim o fizer será feliz, porque os fazedores de cultura iriam se unir à secretaria e divulgar a secretaria nos bairros em todos os lugares”, apontou.
“Teremos o 1% para a cultura [em 2024], não abrimos mão. Eu acho que R$ 12 milhões se a prefeita colocasse para a cultura seria o ideal no próximo ano. Porque nas mãos dos trabalhadores da cultura, esse recurso iria afetar a segurança pública positivamente, iria ampliar o turismo, trabalharia o empreendedorismo artístico. Nós temos que investir no presente e a cultura é a melhor solução para termos um futuro melhor”, completou Guerreiro.
CONQUISTA
Apesar do burburinho provocado pelos extremistas de direita e direitistas da base da prefeita, a grande maioria dos vereadores manifestaram-se a favor de apoiar a solicitação da cultura alterando a peça orçamentária, em que ela previa apenas R$ 4 milhões para 2024: “Vamos brigar por R$ 8 milhões, ou R$ 12 milhões”, disse Carlão durante a sessão.
Outra apoiadora dos trabalhadores e trabalhadoras da cultura, a vereadora Luiza Ribeiro (PT), avaliou que o movimento cultural saiu vitorioso.
“Duas coisas são conquistas. Primeiro: o movimento trazido ontem para a prefeitura e hoje aqui para a Câmara, coloca para a cidade a crise de investimentos do Executivo Municipal, especialmente na Cultura, principalmente nos editais de fomento. Então, para que não estava sabendo, não estava atento, vocês com o movimento conseguiram mostrar isso para a cidade. E, segundo: nós conseguimos apoio da Câmara, porque o presidente Carlos Augusto Borges, o Carlão, ele deixou muito claro que ele vai fazer interlocuções com a prefeita no sentido de ampliar os valores para janeiro, para alcançar no mínimo R$ 8 milhões que vocês estão reivindicando, também em razão da falta de investimento e abandono nos anos de 2022 e 2023 por parte da prefeita”, disse.
Para Luiza, o ataque de alguns colegas do legislativo aos trabalhadores da cultura são frutos do radicalismo.
“Eles sabem que a cultura é importante, que os nossos melhores momentos da vida são atravessados pelas expressões artistas. Essa posição deles é uma questão política que foi posta no Brasil, injusta. O governo do Bolsonaro rotulou arte-cultura como expressões ruins para a sociedade, mas estamos dissolvendo isso com nosso governo de agora, com o ministério forte, com a força da união dos agentes culturais”, finalizou.
Galeria da manifestação ao calote de Adriane Lopes a Cultura na Câmara dos Vereadores de Campo Grande: