Artista e ativista das causas negras em Mato Grosso do Sul, a candidata a vereadora Romilda Pizani (PT), de 47 anos, vai às urnas esperançosa. O lema de sua campanha, “sim, é possível”, expressa a vontade de uma das mais importantes agentes culturais do estado de representar a categoria no legislativo campo-grandense.
Numa reunião com lideranças da cultura na Capital, em 19 de setembro, Romilda destacou que pretende defender o trabalhador da arte. Mais do que "achar" o que o setor precisa, ela sabe por experiência própria. Além de atriz e produtora, Romilda foi coordenadora do Fórum de Cultura de Campo Grande, no Fórum de Cultura do Estado, foi Conselheira Estadual de Cultura e está à frente do Fórum Permanente das Entidades do Movimento Negro de Mato Grosso do Sul (MS).
Em meio ao surgimento de diversos candidatos que se dizem "representantes" da cultura, Romilda declarou que torce para que, caso algum deles seja eleito, represente de fato os artistas na Câmara. “Eu sou esperançosa. Espero que essas pessoas que estão se apresentando como candidatos da cultura, de fato, tenham compromisso com a cultura. E quando falo em compromisso, não estou falando somente em consumir cultura. Compromisso com a cultura é, em especial, olhar para os fazedores de cultura. Quais são as políticas que atendem os fazedores de cultura? Se essas pessoas que estiverem se colocando como representantes da cultura pensarem a partir disso também, eu já me sinto aliviada”.
Roma Rosário Román Anez, ou Roma Román, é boliviana, naturalizada sul-mato-grossense, e hoje, aos 72 anos, trabalha como atriz, figurinista, aderecista, diretora e psicóloga. Ela declarou seu apoio para que Romilda seja uma das vereadoras da cultura na Câmara. “Estou aqui por muitos motivos. Primeiro porque Romilda é uma militante apaixonada. Ela está todos os dias exercendo esse ofício, que não é só um ofício, acho que é uma postura no mundo dela”.
Para Roma, um dos grandes desafios enfrentados por Romilda é a dificuldade de apoio, inclusive por parte da legenda pela qual ela concorre. “Eu não poderia deixar de vir para compartilhar, me solidarizar, porque sei que para ela tem sido muito difícil caminhar sozinha. Faz parte da vida da gente caminharmos sozinhos. Somos quase invisíveis, e por mais que a gente grite, acho que a maioria está surda. Então, é meu amor por ela”.
Ainda conforme Roma, há algumas opções de voto de defensores da cultura, mas acredita que poucos têm um histórico em prol da arte semelhante ao de Romilda. “Não quero ser leviana, mas do que eu acompanho, considero a Romilda, essa pessoa de ofício e de luta. Outra pessoa que não posso deixar de mencionar é a Luíza Ribeiro e o companheiro Chico, que é professor. Como estou próxima, acompanhando de perto, não só de agora, mas de anos anteriores, a caminhada dela é longa. Então, estou com ela”.
Romilda revelou que também tem esperança de que outros candidatos, que se apresentam como sensíveis à cultura, sigam brigando pelos trabalhadores no futuro, eleitos ou não. “Desejo profundamente que esse não seja um compromisso pontual, e sim contínuo. A luta da cultura, para que as políticas públicas culturais aconteçam de forma democrática, é permanente. Não gostaria de ver essas pessoas com essa pauta nesse momento somente, e sim em outros momentos, porque falar sobre política cultural é falar sobre uma luta constante. E é o que a gente precisa: ter pessoas comprometidas com essa pauta”, definiu.
A atriz, produtora e ativista cultural Fernanda Kunzler está surpresa com o surgimento de alguns nomes que nunca estiveram sequer na plateia das apresentações dos coletivos artísticos da cidade, alegando que são ‘nomes da cultura’. “Eu soube recentemente de uma figura que eu falei: mas, ué, é da cultura, como assim? Eu representei a cultura de onde? De qual cultura? A gente já tem um tempo de caminhada, conhece boa parte disso, trabalha com isso, e está no cotidiano da discussão política da política cultural e da estruturação dos direitos da classe trabalhadora. Daí, de repente, surgem umas figuras, e a gente fica assim: tem que se entender de onde elas vieram, como elas vieram e para onde elas vão. É perigoso que essas figuras ganhem e vão representar a gente em quatro anos. Não as vejo representando a gente, não as reconheço como representantes da cultura, porque podem ser pessoas que gostam da cultura, mas a cultura é tanto artística quanto uma cultura de identidade nossa, histórica. Elas podem ter algum envolvimento nisso enquanto cidadãos, mas dizer que são representantes no sentido da gestão pública é um equívoco, porque elas nunca estiveram em uma roda de debate sobre política cultural. Eu não as vi na plateia”, ponderou.
Uma das pautas principais de Romilda, caso seja eleita, é efetivar os direitos culturais por meio da criação de mecanismos legais que evitem calotes, como os aplicados pela atual prefeita Adriane Lopes (PP). “O Fundo Municipal de Cultura é uma das pautas principais para o momento. Estamos tendo um âmbito voltado para a cultura, mas a partir dos incentivos federais e não municipais. Sabemos que, a partir da gestão municipal, o que temos é a boa vontade de conversar com cada gestor que assume a sua gestão para negociar com a cultura. Precisamos regulamentar isso, fazer com que se torne lei um fundo específico para a cultura, porque, ainda hoje, somos uma cultura sem fundo municipal”, explicou Romilda.
Para a candidata, essa pauta é prioritária para que seja possível fomentar e investir em conhecimento e criatividade. “A partir desse fundo municipal, sim, será possível”, defendeu.
Kunzler lamentou que pessoas coloquem seus nomes para apreciação como ‘representantes da cultura, sem compreender a realidade do setor cultural da cidade. “Como você se refere como representante de uma categoria sem nunca ter participado dela, sem nunca ter dialogado com essa categoria? Eu, no lugar, teria vergonha de fazer isso, buscaria meu espaço por meio do que, de fato, tenho de representação. Agora, temos algumas pessoas que são representantes nossas e que reconhecemos porque estão dentro do movimento, já estiveram em espaços de ocupação social, fóruns, colegiados, conselhos de cultura. Essas pessoas têm apropriação para falar por nós, porque conhecem por dentro como funciona nosso pensamento e nossas necessidades, e têm capacidade de propor o que a gente quer, porque estão caminhando junto com a gente”, disse.
O ator, produtor, palhaço e ativista cultural sul-mato-grossense, Anderson Lima, afirmou que, dos anos de luta que ele participa na cidade e no estado, Romilda é a opção mais concreta para representar os agentes culturais na Câmara. “Para ser muito sincero, olhando do lado, não quando tem um incêndio para apagar, mas quando vai começar alguma coisa, que de repente vira um incêndio lá na frente. A pessoa que eu sempre vi para construir as coisas do início é a Romilda. Ela sempre esteve do lado de muitas conquistas que tivemos aqui para a cultura. Tive a oportunidade de participar de projetos com a Romilda. Eu tinha uma combizinha velha, um cinema nessa combi, e a Romilda falou: isso aí é um instrumento para a gente revolucionar. Tive a oportunidade de ir, por exemplo, a Furnas do Dioniso e vi uma experiência incrível na minha vida. Passamos um filme chamado “A Preciosa”, que discute o racismo e abuso sexual dentro de casa. A Romilda fez o discurso depois do filme e, dessa sessão, saiu depoimento de uma adolescente que chegou até ela e falou: ‘Opa, estou identificando isso na minha casa’”, lembrou.
Na avaliação de Lima, ao escolher votar em Romilda, o trabalhador da arte apostará de fato num nome que é da luta. Apesar de haver outras opções, ele diz que Romilda quebra paradigmas. “Escolher o voto para a Romilda, uma campanha que não tem dinheiro e que precisa da militância, é representar a cultura. Não tem como negar isso. Estou falando de coisas de muito tempo. Tomara que a gente consiga colocar bastante pessoas lá que defendam a bandeira da cultura. Quando olho para o lado das lutas que tivemos aqui, lembro da Romilda e não vejo outra”, garantiu.
Dentre as opções para a prefeitura de Campo Grande, Romilda comentou que ficou muito nítido na sabatina organizada pelo Fórum Municipal de Cultura, em 17 de setembro, que poucos têm um conhecimento e uma relação para além do que está pautado no momento. “Mesmo tendo essa relação um pouco mais próxima com a cultura, ainda assim você observa fragilidades nas respostas e no posicionamento. Com certeza, eu quero ver nesse segundo turno maior convicção ao falar de cultura e políticas públicas para a cultura. Essas políticas públicas têm que ser diferentes, contínuas e não pontuais. Não são os editais que vão resolver o problema da cultura. Eles fazem parte de um processo para solucionar algumas etapas, mas não é isso. Precisamos mudar a cultura estabelecida por esse capitalismo local, inclusive conservador, sobre o pensamento e a forma de fazer cultura”, completou Romilda.
O apoio a Romilda Pizani, para Fernanda Kunzler, se deve principalmente ao histórico de luta e caminhada, não só na cultura, mas em outras pautas sociais. “Ela vem com o movimento de mulheres, surge com o movimento negro e está ali debatendo com a gente sobre política cultural. Uma pessoa que vem do movimento negro tem toda a propriedade para falar sobre cultura, está falando da nossa identidade. Ela começou a participar do Teatro Grupo de Risco, numa etapa de formação de conscientização política dos direitos humanos com populações em vulnerabilidade social. Ela se aproxima do Teatro Grupo de Risco e vai participando de espetáculos e filmes, ampliando sua participação, não só dentro do grupo, mas em toda a sociedade. Ela já foi do conselho, do fórum estadual e municipal, esteve na coordenação em todos os movimentos que o movimento cultural da cidade realizou. Esteve nas ocupações, nos protestos, nas caminhadas, em frente à prefeitura, na governadoria, na assembleia e na câmara de vereadores. É uma pessoa ativa, participativa, conhece a nossa realidade e debate sobre a política cultural. Necessária tanto para a classe artística quanto para a população ao redor. Ela mora em um bairro periférico, pega ônibus todo dia, leva a filha na escola e usa a unidade básica de saúde. Então, quem melhor de perto de nós para falar sobre nós? Parte daí é nosso total apoio ao 13.393”, concluiu.