É falsa a afirmação de que o Governo Lula tem interesse em bloquear a rede social X, antigo Twitter, com o objetivo de esconder incêndios florestais supostamente provocados pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A desinformação foi divulgada no perfil oficial do deputado federal Thiago Manzoni (DF) no Instagram e amplamente compartilhada em grupos políticos de Mato Grosso do Sul, com o objetivo de confundir eleitores às vésperas do pleito.
Por meio do projeto "Diversidade nas Redações 3: Desinformação e Eleições", promovido pela Énois, com patrocínio do Google News Initiative, o TTVChecaZap, agência de checagem de fatos da TeatrineTV para as eleições de 2024, apurou que essa alegação é mais uma ‘fake news’.
Nas últimas semanas, os incêndios ambientais que atingiram diversas regiões do país foram utilizados como combustível para a máquina de desinformação da oposição ao Governo Federal. Em grupos de WhatsApp ligados à política de Campo Grande, circulou o link da postagem de vídeo do deputado, que se apresenta como um conservador da direita. No conteúdo, o parlamentar acusa o governo de criticar injustamente os bombeiros que combatiam as queimadas e de bloquear o X para impedir que a população descobrisse que os incêndios teriam sido causados pelo MST.
“Lula acusa injustamente os bombeiros, que estão sendo verdadeiros heróis, de fazerem “corpo mole”, enquanto não assume a responsabilidade do seu governo pela crise de incêndios que assola o Brasil. Para quem ainda não percebeu, o bloqueio do X é uma tentativa clara do governo de impedir que você tenha acesso à verdade”, disse Manzoni.
No entanto, vale destacar que o Supremo Tribunal Federal (STF), responsável pelo bloqueio da rede social, não se submete ao Governo Federal. O Supremo é a mais alta instância do Poder Judiciário brasileiro e tem a função de garantir o cumprimento da Constituição e dos direitos fundamentais. Embora o ministro Luís Roberto Barroso tenha sido indicado pela ex-presidente Dilma Rousseff, sucessora de Lula, o ministro Alexandre de Moraes, que determinou o bloqueio do X, foi uma indicação do ex-presidente Michel Temer.
MST nega acusações de envolvimento em incêndios
Claudinei Barbosa Medeiros, membro da Coordenação Estadual do MST em Mato Grosso do Sul, desmentiu as acusações de que o movimento estaria envolvido em incêndios florestais, afirmando que isso é uma "montagem" usada para desviar a atenção dos incêndios criminosos praticados por latifundiários. “Isso aí é fake [...] Na verdade isso é para tirar o foco dos incêndios criminosos que o latifúndio, que os fazendeiros do agronegócio estão fazendo para causar o caos no Brasil”.
O MST, segundo Medeiros, tem como prática coibir queimadas nos assentamentos e denunciar os responsáveis por elas. Ele ainda ressaltou que, enquanto o movimento é atacado com fake news, está realizando ações concretas de preservação ambiental, como o plantio de árvores em 2.000 hectares em Minas Gerais. “MST não tem envolvimento em nenhum incêndio [...] nós coibimos essa questão das queimadas nos assentamentos”.
Medeiros lamentou a disseminação de fake news, que distorcem a imagem do MST, e reiterou que o verdadeiro responsável pelas queimadas no Brasil é o agronegócio. “Isso aí é coisa de fake news, é coisa de bolsonarista, de extrema direita, de fazendeiro [...] nós sabemos que o culpado das queimadas no Brasil se chama agronegócio”.
Insegurança jurídica contribui para desinformação
Raphael Chaia, pós-doutor em Direito e Novas Tecnologias, professor, pesquisador e autor, explicou que o bloqueio da rede social X no Brasil foi inicialmente justificado pela ausência de um representante oficial, conforme o artigo 1138 do Código Civil. No entanto, mesmo após a empresa cumprir todas as exigências legais, o bloqueio foi mantido, gerando questionamentos sobre a real motivação por trás da decisão. “Mesmo com o cumprimento de todos os requisitos, o STF está mantendo o bloqueio [...] o representante já foi indicado, mas o bloqueio está sendo mantido”.
Chaia destacou que a falta de clareza nas decisões judiciais contribui para a desinformação e insegurança jurídica, especialmente quando novas exigências são impostas sem previsão inicial. Ele também criticou a mudança de critério para a aplicação de multas, que inicialmente visavam apenas quem burlasse o bloqueio com tecnologia, mas foram estendidas a qualquer usuário que acessou a plataforma. “O grande problema desse tipo de decisão que pode levar a desinformação está exatamente na falta de critério”.
O especialista refutou as alegações do deputado Thiago Manzoni, que sugeriu que o bloqueio do X seria uma tentativa de esconder incêndios provocados pelo MST. Chaia considerou essas suposições irresponsáveis, lembrando que as imagens dos incêndios continuam sendo amplamente divulgadas em outras redes sociais. “Você não pode realizar atos com base em suposições [...] as imagens do incêndio estão caindo em várias outras redes”.