
Dentre os 29 vereadores de Campo Grande, a maioria absoluta sequer sabe o que é o Fundo Municipal de Investimentos Culturais (FMIC) ou a Política Municipal de Fomento ao Teatro (FOMTEATRO).
E não sabem por dois motivos simples: primeiro, porque não se interessam minimamente em legislar com responsabilidade; segundo, porque não demonstram o menor respeito pelos trabalhadores e trabalhadoras da cultura local.
Com exceção dos vereadores Luiza Ribeiro e Jean Ferreira — ambos do Partido dos Trabalhadores — que ao menos dialogam com algumas pautas artístico-culturais, os demais 26, da esquerda à extrema direita, demonstram ignorância e descaso quanto ao papel vital da cultura na formação social, política e econômica da cidade.
E o que faz essa Câmara? Em vez de cumprir sua função fiscalizadora e cobrar a execução das políticas culturais que existem — ainda que fragilmente —, perde tempo copiando pautas importadas da extrema direita nacional, como se fossem prioridades para a Capital de Mato Grosso do Sul.
Na manhã desta terça-feira (15.abr.25), por exemplo, os 22 vereadores aprovaram por unanimidade o bizarro projeto de lei apelidado de ‘Lei Anti-Oruam’, copiado, claro, pelo vereador extremista de direita André Salineiro (PL). A lei proíbe que a prefeitura contrate artistas que "façam apologia ao crime organizado ou ao uso de drogas" — uma tentativa mal disfarçada de censura artística, fruto da ignorância de quem não conhece a realidade da produção cultural local.
O que essa turma desinformada parece não saber é que, desde 2022, a Prefeitura de Campo Grande não investe um centavo sequer de recursos próprios em cultura.
Desde que assumiu a cadeira de prefeita, Adriane Lopes (PP) tem dado calote ano após ano nos editais do FMIC e do FOMTEATRO — as únicas políticas estruturadas de fomento à cultura na cidade. E o que faz a Câmara diante disso? Nada. Ou pior: legisla contra os artistas enquanto finge que esses editais não existem.
O QUE É FMIC?
O Fundo Municipal de Investimentos Culturais foi criado pela Lei nº 4.079/2003 e é composto por várias fontes de financiamento, incluindo: Dotações orçamentárias do Município; Patrocínios e doações; Rendimentos de aplicações financeiras do fundo; Recursos de eventos promovidos pelo órgão de cultura; Transferências intergovernamentais; Multas por danos ao patrimônio cultural; Contribuições de empresas (com possibilidade de abatimento de ISSQN) e outros recursos eventuais.
ÁREAS ATENDIDAS PELO FMIC
O fundo contempla projetos nas seguintes áreas: Artes visuais; Artesanato; Design e moda; Gastronomia; Literatura; Música; Audiovisual; Capoeira; Circo; Cultura afro-brasileira; Cultura indígena; Cultura popular e tradicional; Patrimônio cultural (material e imaterial) e Multilinguagens.
FOMTEATRO
A Política de Fomento ao Teatro de Campo Grande (MS), FOMTEATRO, é um mecanismo de incentivo municipal criado para apoiar e fortalecer a produção teatral em Campo Grande. Por meio de editais anuais, o programa destinaria recursos financeiros a projetos teatrais, com o objetivo de fomentar a cena cultural local e valorizar a arte da dramaturgia e encenação.
CALOTE E OBRAS ABANDONADAS
Além dos editais caloteados, obras emblemáticas da cultura da cidade também estão paradas e sem fiscalização por parte do Legislativo. Reformas anunciadas no Teatro do Paço, Praça dos Imigrantes, Morada dos Baís, Centro de Belas Artes e o Complexo Ferroviário seguem abandonadas ou sequer iniciadas. A gestão Adriane Lopes conseguiu a façanha de combinar descaso com financiamento federal e má gestão com total silêncio e omissão da Câmara Municipal. Leia mais sobre as obras abandonadas aqui.
CALOTE INSTITUCIONALIZADO
Em 2024, a Prefeitura chegou a anunciar um investimento total de R$ 9,727 milhões para a cultura:
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R$ 3,2 milhões para o FMIC;
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R$ 800 mil para o FOMTEATRO;
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R$ 5,527 milhões via Lei Aldir Blanc - Recursos do Ministério da Cultura (MinC), do governo do presidente Lula (PT).
Mas, em dezembro de 2024, o Executivo suspendeu os editais do FMIC e do FOMTEATRO. Alegou, por meio de ofício da Secretaria Municipal de Finanças, falta de recursos para execução. Nenhum motivo técnico ou legal foi devidamente explicado. Resultado: mais uma vez, artistas ficaram sem receber e projetos aprovados foram engavetados. A prefeitura retomou os editais da Aldir Blanc no final de março e o prazo de encerramento do recurso é 30 de junho.
No início de 2025, a prefeita propôs pagar o FMIC e FOMTEATRO parcelado, no estilo Casas Bahia.
A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR
Onde está a Câmara? Por que os vereadores não exigem a execução do orçamento cultural já aprovado? Por que legislam sobre censura enquanto ignoram calotes a trabalhadores?
A resposta, infelizmente, está na própria composição da Câmara: despreparo, desinformação e desinteresse real por políticas públicas culturais.
A cultura em Campo Grande não está sendo negligenciada por falta de recursos ou de leis. Ela está sendo sabotada por quem deveria defendê-la: o Executivo que não paga, e o Legislativo que não fiscaliza.