Verificamos: Campo Grande não ocupa o primeiro lugar no ranking de transparência
Prefeita Adriane Lopes (PP) frequentemente usou esse "dado" como ferramenta de autopromoção na campanha eleitoral; no entanto, a informação não condiz com a realidade
29 OUT 2024 • POR Camila Zanin • 09h00Durante os debates do segundo turno das eleições municipais, e em propagandas eleitorais, a prefeita eleita Adriane Lopes (PP) frisou diversas vezes que Campo Grande ocupou o 1º lugar no ranking de transparência entre as capitais, porém o dado distorce a realidade, visto que ao usar seletivamente apenas um índice de transparência pode fazer parecer algo que não é.
Diante disso, o TTVChecaZap, agência de verificação do TeatrineTV, verificou a veracidade desse dado e qual o real contexto do mesmo. O TTVChecaZap é apoiado pelo projeto "Diversidade nas Redações 3: Desinformação e Eleições", promovido pela Énois e patrocinado pelo Google News Initiative.
É importante que a população conheça as limitações de cada estudo e entenda que a verdadeira transparência envolve tanto a qualidade e a clareza dos dados quanto à acessibilidade. Em períodos eleitorais, é comum (e fácil) que políticos tentem levar a população a uma impressão errônea ao utilizar apenas uma dessas métricas para se promover. Isso ocorre porque cada índice de transparência ou governança apresenta uma perspectiva específica, e um uso seletivo distorce a realidade.
O dado utilizado por Adriane está no levantamento realizado pelo Centro de Liderança Pública (CLP) para o Ranking de Competitividade dos Municípios de 2024, no qual Campo Grande alcançou a primeira posição em transparência entre as capitais brasileiras. O estudo avaliou aspectos de governança e gestão pública em 404 cidades com mais de 80 mil habitantes, destacando Campo Grande pela gestão transparente e eficiência na aplicação de recursos públicos. Além disso, a cidade também conquistou a segunda colocação nacional no critério de eficiência da máquina administrativa, avançando em áreas como qualificação de servidores e processos administrativos.
Porém, ao olhar para outras métricas, como o Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP) de 2024, realizado pela Transparência Internacional, Campo Grande alcançou o 13º lugar entre as capitais brasileiras. A avaliação da cidade foi "regular", com uma pontuação de 54,2 em uma escala de 0 a 100, indicando dificuldades para o público acessar informações sobre a aplicação de recursos públicos. Os aspectos mais críticos apontados incluem a transparência em obras públicas e emendas parlamentares, que podem ser vulneráveis a práticas pouco transparentes, especialmente em períodos eleitorais.
A avaliação do ITGP envolve critérios como legislação, plataformas digitais, administração, obras públicas, finanças e participação social. Vitória (ES) foi a única capital a receber uma classificação "ótima", com uma nota de 98,6, destacando-se como um exemplo de governança aberta.
Em outra métrica, Campo Grande obteve uma classificação baixa no Índice de Dados Abertos para Cidades (ODI Cidades) 2023, organizado pela Open Knowledge Brasil (OKBR). O índice mede a transparência e a acessibilidade dos dados públicos nas principais cidades brasileiras. Entre as capitais analisadas, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Curitiba e Fortaleza alcançaram as melhores posições, embora também com níveis médios ou baixos de abertura de dados. Campo Grande, junto a várias outras capitais, ficou com a nota mínima, sendo classificada como "opaca", com pouca acessibilidade e qualidade nos dados oferecidos publicamente.
Metodologias variadas e distorção da realidade
Cada índice utiliza critérios próprios. Por exemplo, o Ranking de Competitividade dos Municípios prioriza indicadores de eficiência da máquina pública e iniciativas que promovem transparência ativa. Já o Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP) e o ODI Cidades da Open Knowledge Brasil focam no acesso a informações e dados abertos, especialmente em áreas como finanças e obras públicas.
Alguns índices, como o do Centro de Liderança Pública (CLP), consideram transparência como parte da competitividade e da capacidade de atrair investimentos e proporcionar qualidade de vida.
Ou seja, é preciso estar atento, as posições nos rankings de transparência e eficiência podem variar, pois diferentes instituições utilizam metodologias e critérios próprios. A divergência entre rankings de transparência em Campo Grande e outras cidades acontece porque esses estudos têm critérios, métodos de avaliação e finalidades diferentes. Quando uma cidade é avaliada como "transparente" em um ranking e "opaca" em outro, isso não significa necessariamente que um ranking está "certo" e o outro "errado", mas sim que cada avaliação foca em aspectos distintos da transparência e governança.
Diferença entre Transparência Ativa e Dados Abertos: Transparência ativa é quando a administração disponibiliza informações essenciais por iniciativa própria, enquanto a abertura de dados refere-se à disponibilização de dados em formatos acessíveis e reutilizáveis. Uma cidade pode ir bem em um e falhar em outro.
É importante que a população conheça as limitações de cada estudo e entenda que a verdadeira transparência envolve tanto a qualidade e a clareza dos dados quanto a acessibilidade.
Assim, quando um político, como fez a prefeita eleita Adriane, foca em uma única métrica favorável, destacar uma classificação alta em um índice, que enfatiza a eficiência da administração, enquanto ignora críticas em outros rankings que avaliam a abertura de dados e a transparência. Isso pode dar a impressão de que a cidade é exemplar em todos os aspectos da transparência, mesmo que em outras áreas a situação seja preocupante.
Ao promover apenas resultados positivos, um político pode evitar discutir os desafios e as áreas que necessitam de melhorias. Isso pode levar a população a acreditar que a administração está funcionando de maneira ideal, sem reconhecer as lacunas que realmente existem, como a dificuldade de acesso a dados ou a falta de iniciativas de transparência.
Para uma cidadania informada, é essencial que as pessoas considerem múltiplas fontes de informação e entendam as diferentes dimensões da transparência. Promover um debate mais amplo sobre essas métricas pode ajudar a sociedade a exigir maior responsabilidade e a buscar melhorias consistentes na gestão pública.