Independente, Palhaços Sem Fronteiras Brasil celebra 8 anos de atuação
Organização já realizou 410 espetáculos e oficinas e projetos, beneficiando mais de 309 mil pessoas diretamente
4 NOV 2024 • POR TERO QUEIROZ • 14h31A organização Palhaços Sem Fronteiras Brasil (PSFB) completa 8 anos de atividades no Brasil, onde atua desde 2016.
No período, a entidade já realizou ações em 10 estados brasileiros e em 6 países da América Latina, focando em territórios de vulnerabilidade socioeconômica e crises huma8nitárias. Sob o lema “Imaginar para construir, rir para transformar”, a PSFB leva alegria e esperança a crianças, adolescentes e adultos.
Ao todo, a entidade já realizou 410 espetáculos e oficinas e projetos, beneficiando mais de 309 mil pessoas diretamente.
A fundadora e diretora executiva da PSFB, Aline Moreno, contou que se envolveu com a palhaçaria na escola profissionalizante de Artes Cênicas e decidiu se tornar palhaça profissional em 2009, após estudar com o argentino Guillermo Angelelli. "Ir para a Argentina estudar foi um grande movimento para descobrir que eu queria mesmo ser palhaça. Lá comecei essa jornada de aprofundamento sobre a palhaçaria, uma viagem que não tem fim sobre a menor máscara do mundo, ela que revela tantas nuances sobre o ridículo no ser humano. Quanto mais conhecemos outros lugares, mais aprendemos como somos diversos, como isso é importante para entender a comicidade e, também, respeitar as culturas e como elas funcionam. O humor tem elementos que se conectam, mas tem coisas que são engraçadas em um lugar e não são em outro", introduziu Aline em entrevista ao TeatrineTV.
Apesar da descoberta na escola profissionalizante, Aline explicou que desder adolescente percebia-se inclinada à palhaçaria. "Eu trabalhei com a animação de festas muitos anos, desde os 14 anos, mas não tinha noção do que era a figura da palhaça. Foi com 18 anos que eu descobri todo esse mundo maravilhoso da palhaçaria e como poderia me envolver nisso".
Conforme Aline, em sua família ela é a primeira a ingressar carreira artística. "Minha família é de Mauá, cidade da Grande São Paulo, eu fui a primeira pessoa a seguir carreira artística, apesar do meu irmão ter uma grande tendência à comicidade. Minha avó paterna queria muito ser artista, mas nasceu em uma época em que o machismo era ainda mais forte e, infelizmente, não pôde seguir na área. Tenho dois primos bailarinos hoje em dia, mas eles também trabalham com outras profissões", revelou.
Antes de encabeçar o PSFB, ela teve experiências que confirmaram que esse era seu caminho. Em 2011, mudou-se para Barcelona, onde organizou um projeto em campos de refugiados Saarauis, na Argélia, com o apoio dos Palhaços Sem Fronteiras Espanha. “Foi incrível! Uma experiência maravilhosa e inesquecível que só fez aumentar minha certeza que era este o meu caminho”, comentou.
A operação no Brasil foi a primeira na América Latina a integrar o grupo internacional Clowns Without Borders, em maio de 2016. Desde então, a organização promove espetáculos e formações em palhaçaria e artes circenses. "A entrada de países do sul global ainda é algo bastante recente no CWB, pois 9 países atualmente são europeus, 2 estadunidenses, 1 sul-americano, 1 sul-africano e 1 indiano. No entanto, entendemos a importância que foi a nossa entrada para reforçarmos o tema da diversidade nesta organização internacional e, também, frisando com frequência as ações anticoloniais que sempre se fizeram necessárias, mas que hoje precisam ser ainda mais reforçadas. O que mudou é que, antes da nossa entrada, muitos países do CWB faziam projetos no Brasil e no restante da América Latina apenas com artistas estrangeiros. Ou seja, com a nossa participação ativa, conseguimos inserir artistas locais nos projetos que são realizados dentro do nosso território de atuação, fomentando toda uma rede de artistas e realizando reflexões, projetos e ações que fazem a inversão do colonialismo", detalhou Aline.
Um dos projetos iniciais, “Riso Doce”, em parceria com a Cia Cromossomos, atuou nas comunidades ribeirinhas do Rio Doce, afetadas pelo rompimento da Barragem do Fundão em Mariana (MG) e Espírito Santo. “Riso Doce” foi realizado em três edições: 2016, 2017 e 2019. E em 2019, a PSFB iniciou outro projeto de grande impacto junto a comunidade indígenas. "O projeto Japuká, que, desde 2019, vem atuando em comunidades indígenas, em parceria com as escolas, impactando mais de 2.000 pessoas no município de Dourados. Foi este projeto que deu início aos Em-baixa-dores do Riso (antiga “Jornada dos Em-baixa-dores”), presente hoje, além do Mato Grosso do Sul, em mais 4 estados brasileiros: Rio de Janeiro, Tocantins, Paraíba e Pernambuco", destacou.
PALHAÇOS NO CENTRO-OESTE
Com uma rede de 80 artistas profissionais, a PSFB já realizou projetos em diversas localidades, oferecendo oficinas e apresentações. Em 2022, a organização contabilizou 120 espetáculos, impactando diretamente mais de 20 mil pessoas. Uma das premissas da organização é a utilização de mão de obra local. "Faz parte dos valores do PSFB a formação de artistas locais em nossa metodologia para que estes sejam multiplicadores dela. Além disso, visamos fomentar pedagógica e financeiramente artistas de nossas regiões de atuação, como uma maneira de alavancar as ações das companhias circenses de cada local, dando nosso apoio e mais visibilidade ao que já vem sendo feito por elas", disse Aline.
Na região Centro-Oeste, a fundadora disse que atualmente conta com 8 artistas, sendo que 6 são palhaços/artistas circenses, 1 é artista ambiental e 1 é professora indígena. 2 residem em Campo Grande e 6 em Dourados. Todos estão no MS. Veja as lista dos integrantes da PSFB:
- Ludmila Lopes - Pior Palhaça do Mundo;
- Wesley Prado - Palhaço Steven;
- Junior de Oliveira - Palhaço Vareta;
- Nilce Maciel - Artista Circense;
- Kelly Figueiredo - Palhaça Mixirica;
- Douglas Moreira - Palhaço Xico;
- Maria Carol - artista ambiental, nome artístico Damata;
- Jadi Ribeiro - Professora de Artes e indígena da Aldeia Bororó.
"Também contamos, neste ano, com dois fotógrafos residentes em Dourados, o Caduts do Memorizart e Kayque Paiva", enumerou.
De acordo com Aline, o projetos 'Em-baixa-dores do Riso' é um exemplo da maneira de atuação do PSFB. "Foi um sonho concretizado. Trabalhar com artistas locais e ter essa ligação com o território é tudo que acreditamos dentro dos Palhaços Sem Fronteiras. Pessoalmente, sinto que foi um marco dentro da minha trajetória como liderança da organização, pois, a partir daí, começamos a operar em 5 estados ao mesmo tempo, o que gerou muita responsabilidade e aprendizado.
Aline explicou que o intuito do PSFB é que projetos como os Em-baixa-dores do Riso se tornem políticas públicas. "Ou seja, que todas as escolas tenham acesso a momentos lúdicos de lazer, jogos, brincadeiras, palhaçaria e artes circenses, pois essas atividades são direitos da criança e do adolescente", apontou.
DESAFIOS E DESEJOS
Questionada pela reportagem de como, nesses 8 anos, a iniciativa tem se 'mantido financeiramente', Aline pontuou: "Por se tratar de uma ONG, ainda que seja internacional, cada país faz a gestão de seus próprios recursos. No caso do Brasil, nossos recursos advêm de patrocínios, leis de incentivo à cultura, editais de fomento nacionais e internacionais, doações de pessoas físicas e, dependendo do projeto, conseguimos apoio financeiro de Palhaços Sem Fronteiras de outros países, sobretudo europeus e/ou da América do Norte".
Ela ressaltou ainda que o desafio principal para manter o PSFB é estritamente a questão financeira. "Apoio de recursos locais para executar as atividades, pois os PSFB, por mais que apoie esses artistas no quesito metodológico/pedagógico e financeiro, muitas vezes os recursos não são suficientes".
A fundadora ressaltou que, apesar do impacto do projeto, mesmo quando procurados, os gestores de Mato Grosso do Sul não firmaram parcerias. "Já tentamos algumas interlocuções e, mesmo que haja interesse, ainda não houve parceria e desenvolvimento de projetos".
Para que o desejo da organização um dia se realize, Aline comentou que será necessário que haja mudança de percepções do impacto da arte vida da população, por parte dos gestores públicos. "Ainda no Brasil, esse tipo de iniciativa não é valorizado. Na Espanha, por exemplo, os PSF fazem parte de um grupo de instituições que recebem subsídios do governo quando algum desastre climático ou ambiental acontece, pois lá a ONG é vista como necessária para auxiliar no suporte da saúde mental de quem está passando por situações traumáticas. Já no Brasil, o poder público ainda está distante de entender o quanto ações como as nossas são importantes para regeneração socioemocional e reconstrução da saúde física e mental em ações pós-traumáticas ou no dia a dia da educação pública brasileira", concluiu.
A inciativa recebe doações voluntárias. Se você quer doar para o Palhaços Sem Fronteiras Brasil, clique no link: https://www.palhacossemfronteiras.org.br/multiplique-sorrisos
HISTÓRICO DO PALHAÇOS SEM FRONTEIRAS
O Palhaços Sem Fronteiras foi fundado em 1993 pelo artista catalão Tortell Poltrona, que realizou um projeto em um campo de refugiados na Croácia.
A iniciativa gerou um movimento global, levando à criação de instituições locais alinhadas aos princípios do PSF na Espanha.
Em 2012, foi estabelecido o Palhaços Sem Fronteiras Internacional, Clowns Without Borders International, para melhorar a comunicação e a colaboração entre os grupos.