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GEORGOIS ARTES LTDA

Empresa de "carioca" receberá mais de R$1 milhão da Lei Paulo Gustavo em MS

Fazedores de cultura apontam inexistência de atividades audiovisuais de contemplado

15 ABR 2024 • POR TERO QUEIROZ • 11h10
Imagem principal
Aaron Salles Torres. Foto: divulgação

A empresa Georgois Artes LTDA, localizada na Avenida Capitão Olinto Mancini, 830, no Centro de Três Lagoas (MS), receberá mais de R$ 1 milhão da Lei Paulo Gustavo (LPG) em Mato Grosso do Sul.  

O proprietário da empresa, Aaron Salles Fernandes Silva Torres, alega que atua em Três Lagoas desde 2018.

Contemplado com R$ 1 milhão no edital de produção audiovisual da LPG, gerenciada pela Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FCMS), Georgois promete produzir o longa-metragem intitulado "Depressão Tropical".

Além solicitar recursos com o nome completo, Aaron também pleiteou financiamento com o nome Aaron Fernandes Silva Torres, subtraindo o 'Salles'. Nessa tentativa, ele foi premiado no edital do município de Três Lagoas para produzir o curta-metragem “Nunca Te Prometi Um Mar de Rosas”, que terá 15 minutos. Um jornal do estado repercutiu a notícia de que Aaron teria recebido um prêmio de R$ 375 mil para produzir o curta-metragem (eis a íntegra). No entanto, o valor global do edital para produção de curtas em Três Lagoas era R$ 691.687,76 (eis a íntegra), com teto de apenas R$ 40 mil por projeto (eis a íntegra). Se Georgois realmente tivesse sido contemplada com essa quantia sugerida pelo jornal Midiamax, Aaron seria o homem a ter recebido o maior financiamento já destinado à um curta-metragem na história de Mato Grosso do Sul, superando até mesmo os valores praticados pela Agência Nacional de Cinema (Ancine).

Como mostramos aqui no TeatrineTV, os editais da Lei Paulo Gustavo em Três Lagoas são alvos de diversas denúncias dos proponentes na cidade sul-mato-grossense.  

No mesmo edital em que a Georgois foi aprovada para realizar o longa-metragem, Aaron buscou captar mais R$ 100 mil em seu CPF para a produção do "Nunca Te Prometi Um Mar de Rosas". Inicialmente ele foi habilitado (eis a íntegra). No entanto, em 19 de março, Aaron foi considerado reprovado na fase documental por não apresentar uma declaração de residência escrita à mão (eis a íntegra). Então, Aaron entrou com recurso e foi considerado novamente habilitado. Posteriormente, em 10 de abril, a FCMS disse que ele desistiu da vaga por 'obter outras fontes de recurso para realização do projeto' (eis a íntegra).  

Ainda no edital da LPG gerenciado pela FCMS, Aaron buscou captar mais R$ 75 mil para o restauro e finalização do curta-metragem 'Olhos do Mar'. Ele pleiteou esse recurso na categoria 'Patrimônio Cultural' do edital. Nessa investida, Aaron ficou como 2º suplente e ainda pode conquistar mais esse recurso caso haja desabilitados (eis a íntegra). 

"CARIOCA EM MS"

Cartaz de um filme dirigido por Aaron no Rio de Janeiro. Foto: ReproduçãoCartaz de um filme dirigido por Aaron no Rio de Janeiro. Foto: Reprodução

Aaron tem afirmado que vive em Mato Grosso do Sul. No entanto, diversos fazedores de cultura do audiovisual sul-mato-grossense sustentam que ele não tem atividade conhecida no estado nos últimos anos.

Quando Aaron começou a pleitear recursos na Lei Paulo Gustavo em MS, ele fez contato com veículos de imprensa do estado para publicar matérias falando sobre sua trajetória, afim de ‘ser visto’. “Mas esse cara não é daqui. Pode procurar na internet, tudo que ele tem é de carioca. Ele é um cara do audiovisual carioca, isso sim. Na verdade, ele é carioca. Só nasceu aqui, mas não tem filmes aqui na última década”, reclamou uma produtora audiovisual, que terá o nome preservado. 

"Pode procurar as redes sociais dele, lá ele diz que é do Rio de Janeiro, carioca, e vai pegar quase R$ 1,4 milhão da LPG, em MS", complementou outro trabalhador do audiovisual sul-mato-grossense.

Em sua rede social, Aaron de fato afirmava ser morador do Rio de Janeiro, com diversas postagens ostentando praia e vida carioca. Eis um print: 

A rede social foi desativada depois de o TeatrineTV procurar Aaron. Eis: 

ACUSADO, PRESO E ARQUIVADO

Reportagens jornalísticas em veículos nacionais relatam que Aaron foi acusado e preso, junto com o namorado, por estelionato em um hotel de luxo em 9 de dezembro de 2020, no Rio de Janeiro. Na época, o casal enfrentou acusações de usar cartões clonados. Anos mais tarde, Aaron conseguiu se livrar das acusações, com o arquivamento do processo. Desde então, Aaron afirma que o processo foi uma perseguição da polícia carioca após ele filmar um episódio de violência doméstica cometida por policial contra uma namorada.

O CINEMA DE AARON EM MS

Oriundo de uma família de alta classe de Mato Grosso do Sul, Aaron viveu grande parte da vida nos Estados Unidos, onde formou-se em Cinema, Vídeo e Novas Mídias, na Escola do Instituto de Arte de Chicago. Depois voltou ao Brasil, instalando-se no Rio de Janeiro.

No Rio, Aaron alcançou o auge ao dirigir um sitcom no Multishow.

Apuramos que ele veio efetivamente para Mato Grosso do Sul em 2020, para fugir dos holofotes negativos causados pela sua prisão.

Nos últimos anos, Aaron não possuiu qualquer atividade audiovisual em Mato Grosso do Sul. 

Diversos integrantes do Colegiado de Audiovisual do Estado – movimento organizado da linguagem no estado – afirmam desconhecer Aaron com integrante da cadeia produtiva do audiovisual.

A reportagem apurou que em Três Lagoas, a primeira vez que ele foi visto pelos artistas, foi na audiência da Lei Paulo Gustavo em 2023. Antes disso, o movimento cultural da cidade não registrava nenhuma participação dele em atividades em prol do audiovisual.

O QUE DIZ AARON?

Desde 3 de abril, o TeatrineTV busca manifestações formais de Aaron sobre os apontamentos apresentados nesta matéria.

Em conversas com o repórter, Aaron insistiu que são reclamações falsas, mas não quis enviar um posicionamento formal que pudéssemos publicar.

Diante disso, o repórter irá apresentar um resumo das manifestações feitas por Aaron no WhatsApp:

Inicialmente, o cineasta ameaçou cometer um ato contra a própria vida caso o conteúdo jornalístico fosse publicado, a fim de intimidar a continuidade do trabalho jornalístico.

Aaron argumentou que foi perseguido pelo crime organizado carioca e que, devido a isso, fora de Mato Grosso do Sul ninguém sabe onde ele reside.

Então, o repórter confrontou-o com releases enviados por sua assessoria à imprensa sul-mato-grossense meses antes, nos quais afirmava estar vivendo em Três Lagoas. Aaron justificou que o conteúdo jornalístico não teria potencial para alcançar o Rio de Janeiro, portanto, ele ainda estaria 'protegido'.

Em seguida, Aaron disse ‘estar no espectro autista’ e que, devido a isso, é isolado, por isso não teria se contato com os artistas sul-mato-grossenses nos últimos anos. Ele alegou que seu foco é o trabalho e que, por isso, desde 2020 tem se dedicado integralmente à escrita dos roteiros do curta-metragem e do longa-metragem que propôs à LPG. Além disso, Aaron citou a editoração de livros que fez no período.

Para publicar suas manifestações, o repórter enviou as perguntas a Aaron, mas ele não as respondeu. Posteriormente, em 4 de abril, a reportagem foi procurada pela *assessora de imprensa de Aaron, uma mulher que vive no Rio de Janeiro. Enviamos as mesmas seguintes perguntas à profissional, para serem respondidas por Aaron:

  1. Como você explica as discrepâncias entre as informações fornecidas em seus pedidos de financiamento, incluindo a omissão do sobrenome 'Salles' em uma das solicitações?
  2. Poderia esclarecer por que tentou captar recursos na Lei Paulo Gustavo usando variações de seu nome e não apresentou a documentação necessária em um dos processos?
  3. Há uma série de questionamentos sobre sua residência e atividades no estado de Mato Grosso do Sul. Como você descreveria seu envolvimento real com a comunidade artística e audiovisual no estado?
  4. Poderia comentar sobre os relatos de sua prisão por estelionato no Rio de Janeiro em 2020? Como isso influenciou sua relação com os processos de financiamento e seu trabalho no setor audiovisual?
  5. Dado o histórico e as informações em sua rede social, por que você escolheu Mato Grosso do Sul como local para receber recursos da Lei Paulo Gustavo e desenvolver projetos cinematográficos?
  6. Qual é o seu envolvimento atual com a comunidade artística de Três Lagoas e de Mato Grosso do Sul em geral? Como você pretende contribuir para o desenvolvimento cultural e audiovisual da região

Poucas horas após a assessora receber as perguntas, Aaron entrou em contato com lideranças do sindicato de jornalismo de Mato Grosso do Sul alegando que estava sendo 'ameaçado' pelo repórter do TeatrineTV com a publicação de uma matéria contendo informações falsas e infundadas. Na comunicação com a liderança, Aaron ameaçou que, assim que a matéria fosse publicada, ele entraria com uma ação criminal contra o repórter do TeatrineTV.

Sobre as respostas às perguntas da reportagem, até publicação deste conteúdo, a assessora não enviou posicionamentos. O espaço segue aberto para futuras manifestações.  

*Essa matéria foi alterada às 8h10 da terça-feira (16 de abril de 2024) para remoção do nome da assessora de imprensa de Aaron, a pedido da própria assessora, que também esclareceu que não é carioca, apesar de viver no Rio de Janeiro.