Superando desafios, Cia faz oficina de 7 dias com mestre circense
14 JUN 2023 • POR • 19h13O multiartista, Rodrigo Mallet, ministrou de 5 a 11 de junho, a Oficina de Acrobacia, do projeto 'Circo.Lação', da Cia Pisando Alto, idealizado pela artista e produtora Fran Corona, em Campo Grande (MS).
Com pós-doutorado, doutorado e mestrado em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Mallet é reconhecido nacionalmente no cenário artístico do circo, mas sua simplicidade, generosidade e capacidade de conexão profissional com os alunos de diversos níveis técnicos, sobrepõe os títulos.
Tendo acumulado conhecimentos como acrobata, malabarista, palhaço, ator, professor e pesquisador, ele disse que desejou sim, passar técnicas aos 12 artistas inscritos na oficina, mas, além disso, quis trocar ideias, vivências com os profissionais e ampliar repertórios.
“Mais do que vir aqui ensinar algo, eu vim aqui oferecer uma experiência diferente e juntar com a experiência das pessoas daqui, para quem sabe criar algo, para a transformação do conhecimento. Eu quis ampliar meu repertório e o das pessoas que estão aqui”, introduziu numa conversa com o TeatrineTV ao final da oficina, no domingo (11.jun.23).
O ministrante veio à Capital de MS acompanhado da esposa, Rebecca Stauffer e da filha do casal, Gal, de 4 meses. Rebecca também é artista de circo e auxiliou Mallet na realização de algumas figuras em dupla. A família vive em Curitiba (PR), onde comandam projetos por meio da Cia Bravata — Companhia de Circo e Teatro.
Assistente de Produção do projeto, Moreno Mourão, contou como conheceram Mallet. “A gente conheceu o Rodrigo Mallet na Escola Basileu França de Goiás, em 2022, quando fomos fazer uma formação de técnica circense lá, onde ele era o coordenador. A didática dele é bem legal para ensinar acrobacia, portagem, o passo a passo até chegar nas figuras. Aqui em Campo Grande eu e Fran sentimos a necessidade de ter esse conhecimento que fomos buscar em outro estado. E com o projeto Circo.lação do FIC, pensamos não haver ninguém melhor que ele para vir nos transferir conhecimentos", esclareceu.
Na sede da Cia Pisando Alto, na Rua Joaquim Murtinho, 2204, ministrante e inscritos da oficina se reuniram sempre das 14h às 18h, ao longo de 7 dias. Ininterruptamente os desafios foram sendo superados, tanto no que tange ao obstáculos físicos, quanto aos estruturais.
Moreno apontou a oficina como a possibilidade de real vivência e aprendizado. “A oficina de uma semana nos dá possibilidades de trabalhar e desenvolver de fato. Tivemos 7 dias de passo a passo, de como chegar em um resultado, para alcançar uma efetividade, chegar às figuras desejadas. Então, o passo a passo do Mallet, nos dá oportunidade de que haja um caminho para a técnica e para o corpo”, sustentou.
Fran celebrou a presença do profissional e citou o fortalecimento da rede circense na Capital. “Foi uma honra ter o Mallet aqui com a gente. Fico feliz de ter conseguido com esse projeto ampliar o acesso à formação. Vamos formar uma rede também, mais gente para se encontrar e treinar”.
Uma das integrantes da oficina, Ana Flávia, disse que teve algumas experiências com circo, mas as oficinas rápidas não a permitiram atingir as conquistas obtidas na semana com Mallet. "Com essa oficina contínua foi completamente diferente, porque conseguimos pegar os movimentos na cabeça e no corpo, né?", comentou.
Sobre os 7 dias imersos em aprendizado circense, Ana foi objetiva: "Para mim, foi surpreendente, porque havia movimentos que eu tinha medo, mas aí observando e escutando as instruções do Mallet. Eu vi com a cabeça que algumas coisas eu não iria conseguir, mas quando cheguei aqui consegui fazer a parada de mão com o apoio do ministrante. Achei necessária essa oficina mais longa, porque geralmente temos oficinas curtas. Essa foi uma semana muito intensa, impressionante e o desejo é que continue".
Na semana, os inscritos nas oficinas realizaram preparos físicos e tiveram acesso à noções de acrobacias de solo, figuras na 2ª altura e introdução ao "mão a mão" (acrobacias a partir de duas pessoas).
FORMAÇÃO E ESPAÇO CIRCENSE
Para Mallet o projeto de Fran e Moreno possibilitou um intercâmbio de maneira certeira.
“É preciso trocar, seja com os grupos, artistas daqui, ou com os profissionais de fora. O caminho para o fortalecimento do circo é trazer profissionais especialistas em determinadas técnicas, para talvez desenvolver esses grupos circenses daqui. O projeto fortalece isso, com essa iniciativa pessoas que talvez não tivessem possibilidade conseguiram acessar técnicas mais apuradas, com determinada metodologia”, avaliou.
Na Capital sul-mato-grossense, na visão de Mallet, tem algumas áreas culturais que se destacam e outras que são carentes de formação.
“A cena aqui, pelo que tenho visto, é forte o teatro, a dança em alguns sentidos… O circo ainda precisa alavancar algumas coisas, ter mais grupos, subir níveis técnicos de algumas modalidades circenses, lógico que eu não pude conhecer toda a cena aqui, mas pelo que vi há uma boa parte para desenvolver”, apontou.
Conforme o ministrante, além de apoiar projetos como o de Fran e Moreno, o poder público deveria investir em espaços dedicados à prática e ao estudo do circo.
“Os espaços pensados para as modalidades de circo é importante que existam. Um espaço que você adapta, você restringe algumas possibilidades. Por exemplo, num teatro você não consegue instalar determinado equipamento de circo. Então, isso acaba limitando o artista, isso é um ponto. Outra coisa, é que se não há um espaço dedicado aos artistas de circo, não há uma troca entre esses artistas. Para de fato apoiar o artista de circo devem ser pensados espaços especializados, que tenham um fosso, colchão de aterrissagem, pontos mais altos para fazer ancoragens para possibilitar outras vivências, outras modalidades artísticas e oferecer segurança a esses profissionais”, definiu.
Moreno indicou que espaços da arte circenses são diversos: “O circo é amplo, ele não está só numa lona. É uma linguagem da Arte Cênica que está dialogando com teatro, música, dança… Quando ocupamos outros espaços, fortalecemos o fazer circense”. Entretanto, o produtor esclareceu que os espaços para o estudo da arte circense precisam de condições estruturais. “Porque aqui onde fizemos, por exemplo, a altura é limitada, né? A prefeitura tem espaços olímpicos que poderiam ser usados para isso, só que burocraticamente não conseguimos acessar estes locais… Se tivéssemos equipamentos disponíveis, claro que poderíamos chegar em resultados superiores”.
Mallet conclui apontando que cumpriu seus objetivos da oficina nas expectativas, mas algumas coisas ficaram para uma próxima oportunidade. “A ideia do projeto era ampliar o repertório e desenvolver algumas coisas específicas. Considero que ampliamos bem o repertório, mas o desenvolvimento específico talvez tenha que ocorrer em um segundo momento”.
"Na oficina aqui o que conseguimos foi dar um pontapé, onde o Mallet nos trouxe tudo com bastante didática e cabe a cada um de nós aqui insistirmos nos treinos para aprimorar", completou o produtor.
EXECUÇÃO 'ARROCHADA'
Além da oficina, o projeto da Cia Pisando Alto inclui circulação híbrida, com apresentações presenciais e exibição de espetáculo no YouTube, tudo com audiodescrição e libras.
Ao todo, a Cia fará seis apresentações do espetáculo 'Gran Finale', sendo duas apresentações em Campo Grande, duas em Dourados e duas em Corumbá.
Em cada cidade, uma apresentação será aberta ao grande público e a outra apresentação será voltada para alunos de escola pública.
Nas escolas públicas a Cia também realizará uma oficina circense para os estudantes. E, em Dourados e Corumbá, a companhia fará intercâmbio com grupos locais de circo e teatro, para troca de conhecimentos e experiências.
Aquilo que chamaram de ‘circulação híbrida', envolve exibições, com datas e horários das apresentações que ainda serão divulgadas.
Para realizar tudo isso, Fran e Moreno tiveram o financiamento de apenas R$ 83.529 do Fundo de Investimentos Culturais de Mato Grosso do Sul (FIC/MS), num edital de 2021, que em razão dos atrasos de pagamento da Fundação de Cultura de MS (FCMS), somente pode ser executado agora.
Fran apontou o FIC como um mecanismo de promoção cultural que precisa ter o cronograma público respeitado, para não haver prejuízo a proposta original. "A gente pensa em profissionais e serviços de excelência para estar em nossos projetos, porém quando o intervalo de escrita e execução é longo a gente enfrenta uma readequação financeira de valores que subiram que pode acabar por inviabilizar ou prejudicar o andamento do projeto e isso interfere no nosso trabalho porque parece que sempre o valor que dispomos para o trabalho é inferior a um valor justo. Parece que sempre estamos dependendo de uma boa vontade dos profissionais trabalharem por um valor desatualizado", analisou.
Para a idealizadora do Circo.Lação, sempre que se atrasam os pagamentos dos contemplados no FIC há um efeito financeiro, que leva os artistas a situações constrangedoras. “Parece que estamos sempre com dinheiro em falta. Uma passagem que custava x, na época da inscrição, hoje já é outro valor. Alimentação, hospedagem… Essas coisas, com o atraso do FIC, são afetadas”, explicou.
Apesar dos desafios estruturais e financeiros, Fran disse que pretende apostar em novas edições de oficinas no Circo.Lação, visto o impacto positivo desta edição. “Temos a vontade de trazer outros profissionais ou mesmo com o Mallet, num formato de aprofundar, queremos possibilitar a formação dos profissionais”, finalizou.
O projeto Circo.Lação conta ainda com a Produção de Nilce Maciel, tem como Divulgador de Mídias, Febraro Oliveira, a Assessoria de Imprensa é de Isabela Ferreira (da Reconta Conteúdo) e a Arte Gráfica é de Maíra Espíndola.
A CIA
A Cia Pisando Alto foi criada em 2019 pelos artistas e produtores Fran e Moreno, que atuam juntos pesquisando circo desde 2012. Os dois cursaram Técnico em Artes Circenses na Escola Basileu França, em Goiânia-GO, onde também fizeram diversas capacitações na área. A companhia atua com circo e teatro em espaços abertos e não convencionais, utilizando algumas técnicas circenses: malabarismo, acrobacias, portagem, perna de pau, aéreo e equilibrismo.