Trupe faz 'show' rebolando de sunga para crianças e prefeitura se diz 'enganada' (vídeos)
Trupe disse que a prefeitura foi negligente e que o espetáculo continha aviso de classificação indicativa; político extremista tenta tirar proveito
13 MAR 2023 • POR • 19h33Uma trupe circense apresentou o Show do Cupido no domingo (12.mar.23), com conteúdo considerado 'inapropriado' para um público em que haviam crianças em Amambai (MS). A apresentação foi atacada, por uma digital influencer de um condomínio de luxo e a prefeitura da cidade, que estava auxiliando na divulgação do evento, disse ter sido ‘enganada’. Entenda abaixo.
O QUE ACONTECEU?
- A trupe do Circo Mundo Mágico Espacial fez um show e foi ameçada de morte, após uma digital influencer incitar ataques à apresentação, considerada inadequada para crianças;
- A prefeitura de Amambai disse ter sido enganada e que o show continha cenas de cunho sexual;
- A trupe disse que a prefeitura foi negligente e que o espetáculo continha aviso de classificação indicativa, não indicada para menores de 12 anos;
- A Funarte não confirmou que a trupe é apoiada pelo ente ligado ao Ministério da Cultura.
O CASO
Por meio da Secretaria Municipal de Desporto e Cultura (SEDESC) e da Secretaria Municipal de Comunicação (SECOM), a prefeitura disse que foi surpreendida negativamente com o ocorrido envolvendo o espetáculo Show do Cupido, em que um ator de sunga é visto rebolando no colo de um pai, que imediatamente puxa sua família e deixa o local.
“Conforme verificação prévia com base no portfólio disponibilizado pelos artistas e levando em consideração que a companhia está em turnê pelo Mato Grosso do Sul, nada foi encontrado que desabonasse a trupe até então. Por isso, a administração concordou em auxiliar na divulgação do “espetáculo”, explicou o Executivo amambaiense em nota.
A diretora de Arte e Cultura, Alessandra Tavares disse ao TeatrineTV, que a trupe do Circo Mundo Mágico Espacial, a procurou, dizendo estar sendo apoiada pela Fundação Nacional de Artes (Funarte) para uma circulação pelo Brasil. Na ocasião, os responsáveis mostraram um portfólio bem fantasioso para conseguir o apoio com cedência do espaço à apresentação: “Única coisa que pediam era a cedência do Ginásio. E como contrapartida, eles doariam 5% do valor arrecadado [com a venda de ingressos] para a instituições como Lar do Menor [Apae de Amambai] e ofereceriam uma oficina gratuita de circo. Achei bom, fechamos a data”, explicou a servidora.
Eis um áudio enviado à servidora de Amambai sobre a proposta:
Apesar disso, a prefeitura não conseguiu oferecer o ginásio, em razão de um embargo do Corpo de Bombeiros. “Quando fui ver o Alvará para o “show” os bombeiros disseram que não poderia acontecer, pois o Alvará é para eventos esportivos, somente. Então cancelei com eles”, esclareceu, apontando que não houve apoio financeiro do município.
Ainda assim, o grupo alugou um espaço de eventos na cidade e seguiu com a apresentação de maneira independente. “Como eles já haviam feito a divulgação, inclusive nas escolas, vendeu bem! Então, resolveram alugar um clube na cidade para fazer acontecer... Então, foi um show de horrores. Os pais começaram a levantar e sair e alguns pediram o dinheiro de volta”, contou Alessandra. Eis o vídeo em que ator rebola no colo do pai:
De acordo com a servidora, o conteúdo do espetáculo não era o mesmo apresentado na proposta de parceria do grupo. “Coisas bem desagradáveis, com cunho sexual, bem impróprio para crianças”, disse Tavares. Acrescentando a posição da prefeitura em relação ao episódio. “Nosso trabalho aqui com arte e cultura é sério! Desenvolvemos muitos fazeres artísticos para todas as idades. De cunho cultural, educacional e social. Nosso município jamais compactuaria com a linguagem mostrada nesta apresentação”, adicionou.
O QUE PROMETERAM?
Criado e idealizado em São Paulo pelo ‘Palhaço Cupido’ – Palhaço que diz ter trabalhado no Circo Beto Carrero World – o grupo prometia um resgate à poesia de uma arte milenar e uma estrutura incrível com um espetáculo excepcional.
“Muita alegria e diversão com toda segurança, seguindo todos os protocolos de saúde. Somente Domingo”, dizia no site Sympla onde os ingressos eram vendidos por R$ 35.
O show, na ocasião do anúncio, iria acontecer no Ginásio de Esportes Amambaí nesta 2ª.feira, das 18:30h às 20:30h. Entretanto, acabou ocorrendo ontem.
À prefeitura de Amambai, a promessa da trupe foi de que faria um show com personagens como Homem de Ferro, Coringa, La Casa de Papel e que em momento algum fizeram menção ao conteúdo impróprio para crianças e muito menos à faixa etária indicada para o espetáculo das 20h30.
“Além disso, a companhia foi omissa e não se preocupou em restringir o acesso de menores de 16 anos ao recinto onde ocorreu o “espetáculo”, fator que também não foi levado em consideração na venda dos ingressos tanto pelo site quanto nos pontos físicos e muito menos na divulgação feita pelos membros da trupe nas escolas do município e no material produzido e deixado por eles com os estudantes”, apontou a administração.
“Diante disso, a Prefeitura de Amambai manifesta seu repúdio à qualquer ação “artística” ou não que coloque crianças e adolescentes em situações como as ocorridas durante a apresentação do Palhaço Cupido e informa que já está tomando as providências cabíveis”, finalizou.
O prefeito da cidade, Edinaldo Bandeira (PSDB), fez um vídeo reforçando a indiganção do executivo. Veja:
PROVEITO POLÍTICO
O deputado estadual Rafael Tavares, querendo tirar proveito da situação, divulgou um vídeo com informações falsas em sua rede social, afirmando que a prefeitura teria usado dinheiro público para 'pagar a trupe'. A afirmação de Tavares é falsa! Eis o vídeo que ele divulgou em suas redes:
Seguidor de Olavo de Carvalho e extremista de direita apoiador de Jair Bolsonaro, Tavares elegeu-se em 2022 tirando proveito de assuntos chaves, tendo como ferramenta de manipulação o conservadorismo.
FAMÍLIA LYRIO E A FUNARTE
A empresa de circo Circo Mundo Mágico Espacial alegou ter sido criada em São Paulo, mas num documento enviado à prefeitura, o CNPJ informado: “14.258.538.001-05”, está cadastrado em nome de Márcia da Silva de Gusmão Lyrio (a mãe). A empresa teria sido fundada em 2011 no município de Vila Velha no Espírito Santo.
Há ligado ao nome de Carlos Alberto de Gusmão Lyrio Júnior o CNPJ “31.691.851/0001-51”, com o nome fantasia 'Lyrio - Festas e Eventos', aberto em 4 de outubro de 2018, também em Vila Velha. Esse último diz ter como atividade principal serviços de “Restaurantes e similares”. Júnior Lyrio seria dono do espetáculo "Mundo Mágico Espacial", mas não fechou parceria de apresentação junto à prefeitura de Amambai, pois a administração acabou fechando com o irmão de Júnior, "Carlos Eduardo Lyrio". "
A reportagem procurou a Coordenação de Difusão do Centro-Oeste (CD-CO) da Funarte, e ao telefone, Rafaela Mendes Serique disse que inicialmente não encontrou nenhum ato de parceria entre o Circo Mundo Mágico Espaciale a Funarte. Entretanto, a servidora pediu que o caso fosse encaminhado via e-mail, para uma busca mais aprofundada. "Tivemos um edital para grupos de circo ano passado, precisamos verificar se há esse grupo entre os selecionado", obervou.
Mais tarde, por e-mail, a Funarte disse ao TeatrineTV: "Encaminho o presente e-mail para conhecimento e providências subsequentes. Informo que o Circo mencionado não foi contemplado pelo Edital às Famílias Circenses de responsabilidade desta Coordenação", apontou, negando qualquer relação com o Circo Mundo Mágico Espacial.
HOMOFOBIA E AMEAÇAS
O contato telefônico disponibilizado para falar com Carlos Alberto Gusmão Lyrio (o pai), foi o "35 9916-7033", um contato em Minas Gerais que desembou no filho'Júnior Lyrio', que explicou que na verdade o responsável pelo evento seria seu irmão, Carlos Eduardo Lyrio. "O responsável do Evento não sou eu, só faço parte da equipe de publicidade, agendamento. Provavelmente meu número está lá dentro de uma folha, explicando sobre o projeto", argumentou, cedendo à equipe o contato de Eduardo.
Procurado, ao atender a ligação, Carlos Eduardo disse que estava na estrada. "Não sei se vou conseguir, mas vou tentar explicar, porque estou na estrada e a ligação pode cair a qualquer momento [a partir daqui a ligação começa a falhar]"... Sem conseguir contatar o responsável via ligação, enviamos mensagens com questionamentos sobre a apresentação em Amambai. Ele respondeu rapidamente: "Nosso espetáculo é divulgado exatamente da forma que ele acontece, caso queira tirar algumas dúvidas, no Instagram temos tudo em nossas postagens, estamos sendo vítimas de pessoas homofóbicas e preconceituosas, pois nosso espetáculo, é levado por todo o Brasil da mesma forma", iniciou oferecendo o link dessa página de Instagram abaixo. Nas artes não a menção à classificação indicativa, apenas na bio do Instagram:
Ainda segundo Eduardo eles estão sendo injustiçados. "Estamos sendo literalmente julgados e crucificados por pessoas maliciosas, já levamos o evento em várias cidades do Mato Grosso do Sul, e nunca tivemos problemas com nossas apresentações. Não estão nos dando nem a chance de dizer o que realmente aconteceu. Pois muitas das pessoas que assistiram estavam nos defendendo no momento dessa confusão! Porém, uma Influenciadora digital em troca de mídia começou a fazer vídeos e incitar as pessoas para pegar o dinheiro de volta! Nossa apresentação sempre foi e vai continuar como é, nunca tivemos problemas com isso, a não ser na Cidade de Amambai! Estamos agora sendo prejudicados injustamente tendo nossas apresentações canceladas por uma difamação", apontou.
"Essa confusão, que algumas pessoas estavam pedindo o ingresso na hora do início da apresentação, tudo bem, nós não negamos em devolver o ingresso. Só que nesse período, as pessoas estavam ligando para as pessoas lá de dentro e, entrando novamente, para chamar as pessoas lá de dentro, para todo mundo pedir o dinheiro de volta. Foi um motin que aconteceu ali, onde eles queriam realmente atrapalhar, prejudicar a gente. E a gente está levando essa fama agora. Algo injusto que a a gente está levando nosso espetáculo para todo Brasil. O que nós estamos sofrendo é uma calúnia, uma difamação", argumentou.
Carlos Eduardo disse que a má repercussão em Amambai com a divulgação de coisas que não são verdadeiras, prejudicou a trupe. "Nossa equipe de marketing passa nas escolas convidando os alunos, e deixando bem claro que a 2ª sessão, a das 20h30 não é recomendada para menores de 12 anos. A gente deixa bem claro. Tocamos no assunto de duas a três vezes nas salas. E, mesmo assim, as pessoas em várias outras cidades participam e nunca tivemos esse tipo de problema. Esse tipo de repercussão ruim", avaliou.
Em razão da má repercussão da apresentação aos amambaienses, a trupe disse ter tido sessões em outros municípios de MS canceladas. "Acabou que outras cidades que estavam agendadas aqui no Mato Grosso do Sul como Coxim, Anastácio, Bataguassu, cancelaram os shows. Secretários cancelaram sem mesmo nem procurar saber, o que nós temos a dizer a respeito... Realmente, não aconteceu nada disso! Inclusive, nós estivemos em algumas cidades, né? Passamos ali em Mundo Novo, Eldorado, Naviraí, temos contatos de cada secretário e por onde nós passamos deixamos uma repercussão positiva. Levamos um projeto cultural totalmente diferente do que costuma a vir nas cidades", considerou.
Ainda segundo o responsável pela trupe, o delegado do município orientou a não necessidade da devolução dos ingressos. "O delegado da cidade de Amambai, ele nos orientou que não tinha necessidade nem de a gente entregar o valor que eles pagaram nos ingressos, mas a gente trabalha de forma bem transparente, nós devolvemos, não teve problema nenhum. Em momento nenhum negamos às pessoas que quiseram seu dinheiro de volta", disse.
Além disso, Carlos Eduardo disse que a trupe foi ameaçada de morte. "Infelizmente fomos ameaçados por alguns moradores de Amambai. Dizendo que até amanhã cedo se a gente não saísse iriam atirar, metralhar... Se a gente tivesse algum parente eles iriam matar!", narrou.
Carlos finalizou lamentando a inviabilização da circulação em Mato Grosso do Sul e esclarecendo que palhaço de sunga nunca foi escondido. Para ele, uma influenciadora digital de um condomínio de luxo incitou os ataques à trupe. "E acabou que queimou a nossa imagem. Acabou que a gente não tem mais o que fazer, o projeto não tem como mais trabalhar no estado. Porque todas as cidades que nós agendamos, que tem todo um trabalho, uma logística foi por água abaixo, por causa de uma pessoa que começou a influenciar dentro do clube Alphaville, de uma situação que é mito [clara]... Se você acessar nossa página do instagram você vai ver o palhaço de sunga, em momento algum escondemos isso, é bem claro. É o número do espetáculo. É o nome do espetáculo é show do cupido. Tem imagem tudo aí, está para quem quer ver", rebateu Carlos.
O responsável ainda chamou a prefeitura de Amambai de negligente. "É difícil, a gente aceitar também, essa negligência do que eles estão fazendo com a gente, até mesmo a prefeitura municipal, que foi de início que fecharam com a gente, deixaram a gente desamparado mesmo antes de acontecer o evento".
Sobre a queixa de apresentações que não ocorreram, Carlos disse que foi em razão de ameaças. "Nada disso! O que acontece? As pessoas começaram a fazer motim, lá fora. Saindo, pedindo o dinheiro de volta. Nós permitimos a todas as pessoas que queriam sair. E até mesmo, teve pessoas que com certeza receberam mais de duas vezes e voltaram a assistir o espetáculo. E com isso, as pessoas começaram a ameaçar a gente até a polícia chegar, queriam linchar a gente lá na portaria. E com isso a gente teve que encurtar o espetáculo para resolver esse problema, mas o espetáculo, se nada disso tivesse acontecido teriam todas as apresentações que a gente anuncia. Que é o The Walking Dead, também tem outras apresentações, que a gente anunciou e a gente cumpre sempre em todas as cidades. Inclusive estão aí, no nosso instagram. Todas as apresentações que a gente anuncia, homem de ferro, motoqueiro fantasma, várias outras atrações, todas as cidades acontecem esse tipo de apresentação. Ali não aconteceu porque as pessoas começaram ameaçar toda a nossa equipe. Inclusive um morador falou que iria metralhar todos nós do espetáculo, como a gente continuaria? A polícia ali pedindo para acompanhá-los à delegacia, então, várias situações colocaram a gente para baixo, para que tudo desse errado", finalizou.