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PRETINHOSIDADE

Lotada, 5ª Afronta exalta diversidade, protagonismo negro e feminino

Ação cultural aconteceu no sábado (25.nov.23) na Praça do Preto Velho

Por TERO QUEIROZ • 27/11/2023 • 18:20
Imagem principal (25.nov.23) - 5ª Afronta 'Pretinhosidade' aconteceu na Praça do Preto Velho, em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz

A Afronta 'Pretinhosidade' (5ª edição) aconteceu das 15h às 22h do sábado (25.nov.23), onde mais de 40 artistas campo-grandenses se apresentaram na Praça do Preto Velho, em Campo Grande (MS).

A ação cultural com música, Artes Visuais, Moda e culinária, reuniu centenas de pessoas exaltando o protagonismo feminino, negritude e reverberando a diversidade social e cultural da Capital. 

Thatiane Cortez e Maiara da Silva. Foto: Tero Queiroz Thatiane Cortez e Maiara da Silva. Foto: Tero Queiroz 

A psicóloga Thatiane Cortez, de 32 anos, também conhecida como Niara Muntu, estava envolta nos braços de Maiara da Silva, de 34 anos, abraçadas, ouvindo e cantando músicas a céu aberto. Ela revelou a sua felicidade de ver no evento alternativas para o futuro de jovens negros e negras. “Eu entendo que é importante ter esse evento para eu poder encontrar os meus. Aqui a gente está cantando, dançando e mostrando a nossa potência e não vivendo uma experiência de morte, de violência ou de sofrimento. É importante pensar na diversidade do nosso próprio povo, pensar a diversidade dentro da nossa própria comunidade”, apontou. 

(25.nov.23)  - Gustavo Jordão durante a 5ª edição do Afronta. Foto: Tero Queiroz(25.nov.23)  - Gustavo Jordão durante a 5ª edição do Afronta. Foto: Tero Queiroz

Dançando no gramado da praça, com vestes estilosas, também celebrou o momento o estudante de Artes, Gustavo Jordão, de 25 anos. “Para mim, um jovem preto, estar aqui é uma honra, uma satisfação. Tem muita galera bonita, uma galera diferente, querendo curtir, querendo tomar sua breja com sua família, com seus amigos, conversar, dançar um pouco, tocar um som da hora e ir pra casa bem, ir pra casa feliz. É muito gostoso! Eu não vejo tanto esse tipo de evento aqui, mas quando eu vejo eu tento curtir com todo mundo junto. Daqui eu vou levar amizades, vou levar experiências, e um abraço do nosso Preto Velho ali, para gente voltar para casa bem”, avaliou. 

(25.nov.23) - Jordão e amigos dançam durante a 5ª Afronta na Capital de MS. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Jordão e amigos dançam durante a 5ª Afronta na Capital de MS. Foto: Tero Queiroz 

O público do evento, produção e artistas eram majoritariamente pessoas negras. Apesar disso, na plateia haviam algumas pessoas brancas. Uma delas era Leonardo Vicente, estudante de biologia (licenciatura), de 27 anos, que externou ter satisfação de estar na Afronta. “Não somente por estar tendo uma organização maravilhosa, mas pelo principal foco, que é a galera preta, a galera negra, estar aqui ocupando espaços públicos. Eu sou uma pessoa branca, tá ligado? Mesmo que eu seja periférico eu entendo a necessidade e a urgência de isso acontecer. Isso é um bagulho que gera um conforto, mano. É um bagulho de entender a alegria de podermos estar aqui compactuando, fortalecendo e dando protagonismo”, apontou.

(25.nov.23) - Um grupo de amigos brancos na festa temática da Afronta com maioria do público negro. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Leonardo Vicente (tatuado, de boné) com um grupo de amigos brancos na festa temática da 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

Para Vicente, há diferenças entre ser pessoa de periferia branca e negra. “Eu sinto mesmo, tem muita diferença. Já senti na minha vida. Com 16 anos eu vi, eu presenciei, parça, um bagulho de praça, assim. Nós, lá, só conversando e tal e, assim, mano, tomamos um enquadro e os homi [policiais] mandou eu ir embora e eles nem me registraram enquanto meus brothers que eram pretos, tá ligado? Foram revistados, ficaram lá na abordagem e os caras [policiais] falaram [para mim] vai embora. É um bagulho que me prende até hoje. É uma discrepância que não dá pra descrever, quem vive sabe”, contou. 

(25.nov.23) - Akiris entre as irmãs ($uburbia à esquerda). Foto: Tero Queiroz(25.nov.23) - Akiris entre as irmãs ($uburbia à esquerda). Foto: Tero Queiroz

Além de jovens, diversas crianças estavam presentes no evento. Akiris Jara, de 11 anos, irmão de $ubúrbia (uma das artistas que se apresentou no evento), contou que está há 4 meses frequentando espaços nos quais a irmã se apresenta. “Esse ano eu comecei a vir na Afronta e gosto muito dessa arte, desse espaço, desse ambiente, porque a minha irmã sempre falava bem e eu queria experimentar e quando eu experimentei, na última Afronta, eu adorei demais e quis vir aqui de novo. Eu me senti muito bem vendo a minha irmã no palco. Ela sempre canta em casa, umas músicas novas e é fácil que eu já sei a letra, tá marcada na mente, né? O look dela a gente já sabe como foi montado, já sabe o trabalho que deu...”, disse. Veja a galeria com a cobertura do evento no final do texto.  

RAPPERS PRETAS

(25.nov.23) - $uburbia se apresenta para o público no 5ª Afronta 'Pretinhosidade' em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - $uburbia se apresenta para o público no 5ª Afronta 'Pretinhosidade' em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz 

$ubúrbia é o nome artístico de Vitória Gabrielly, de 21 anos, que canta desde os 16 anos, tendo iniciado como cantora de Hip Hop na Batalha da ZO. “Ter a oportunidade em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, de trazer o que você escreve, sua música autoral de Hip Hop é impressionante. Aqui no Mato Grosso do Sul, a gente sabe da cultura do sertanejo, eu já cantei muito sertanejo, só que sertanejos que não eram meus, não era minha letra e ter essa oportunidade de cantar uma música que eu escrevo, num palco, numa coisa profissional, numa coisa enorme, eu tô muito feliz, eu não sei explicar a felicidade que eu tô sentindo nesse momento. Eu tô me sentindo muito feliz e muito talentosa, porque eu sei que eu tive a oportunidade de subir no palco pra essas pessoas. Nesse momento eu sinto que eu realmente mereço estar aqui, porque eu fui convidada para estar aqui, com essas pessoas que eu admiro tanto, que eu acho tão impressionante (sic)”, disse a artista logo após sua apresentação.

(25.nov.23) - Negalu durante apresentação na 5ª Afronta, na Praça do Preto Velho. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Negalu durante apresentação na 5ª Afronta, na Praça do Preto Velho. Foto: Tero Queiroz 

Costureira, Luciana Ferreira, de 32 anos, conhecida pelo nome artístico ‘Negalu’, integra o grupo ‘Posse Sul Rappers’ composto também pelo Mano BR e Mano Kbça. Negalu também é uma das organizadoras do evento e esclareceu que o Afronta sintetiza a quebrada campo-grandense. “Esse aqui é um evento preto total, todo mundo que subiu no palco é preto, o pessoal que trabalha, os seguranças, a gente pediu que venham pessoas pretas, para fomentar a cultura mesmo e para fomentar financeiramente, nós, pretos. Eu sei que é difícil, mas a gente está tentando e sobrevivendo. É muito importante, porque a gente vive num país extremamente machista, extremamente racista e a gente dar palco pras minas pretas fazer um evento desse, para cultura mesmo, pra todo mundo, pra branco, pra preto, é pra todo mundo, mas a gente tem que dar visão pras pessoas pretas, que são as que mais sofrem no cotidiano”.

(25.nov.23) - Negalu durante apresentação musical na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Negalu durante apresentação musical na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

A artista revelou ainda que a Afronta possibilitou uma noite inédita no que tange a estrutura. “Foi a primeira vez que eu canto em um palco com essa estrutura. A gente faz evento há muitos anos, há mais de dez anos e com nosso próprio recurso, com nosso próprio pessoal, nosso próprio madeirite e a gente trazer gente lá da zona sul pra cantar num palco desse, com uma estrutura dessa, microfone bom, retorno bom, pra gente é realizador mesmo, é por amor mesmo”.        

CULTURA PRETA SÓ EM NOVEMBRO?

Para a psicóloga Thatiane, o poder público deve apoiar eventos com protagonismo negro ao longo de todo o ano. “O governo estadual, municipal, federal, tem que financiar eventos da cultura preta em outras datas também e não só em novembro. Nós ajudamos a construir esse país. Um evento aconchegante aqui na Praça do Preto Velho, espaço que tem toda uma história das nossas tradições, é um evento muito importante que carimba a nossa marca pra além dos espaços de violência”, reforçou. 

Vicente avaliou como necessário o apoio a eventos da cultura preta e cobrou a mudança de ‘olhar’ dos gestores e das pessoas brancas. “Mudar esse olhar é necessidade urgente, um fato! O poder público, a estrutura institucionalizada, às vezes enxerga eventos assim como uma afronta, né? Como o nome do rolê fala. Não é um espaço disputado de forma justa e a gente tem que entender que uma pessoa não preta tem que se solidarizar e compactuar com o bagulho e fortalecer o movimento, respeitando e dando o protagonismo da galera preta”. 

(25.nov.23) - $uburbia se apresenta na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - $uburbia se apresenta na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

$uburbia disse que o poder público tem receio de apoiar com mais ênfase as ações da cultura preta. “Nós não temos festival, nós não temos cultura negra apoiada pelo estado, entendeu? A gente é um movimento contra o estado justamente por isso, porque o estado normalmente não nos quer e a gente quer ser visto, a gente quer ser ouvido, a gente quer cultura, a gente move o mundo, a gente é Hip Hop, a gente muda vidas, pessoas saem de realidades horríveis através do Hip Hop”, enumerou. A rapper ainda apontou que o Afronta é um grande exemplo de como solucionar desafios sociais por meio da cultura. “A gente é cultura de favela, cultura de periferia e eu acho que esse é um dos maiores investimentos que o estado pode fazer, porque se o problema é drogas, se o nosso problema é vício, se o nosso problema é roubo, você tem que estimular os nossos jovens em uma coisa que eles amam e eles amam o Hip Hop. Os jovens amam o hip hop, eu tenho 21 anos e eu amo o Hip Hop e essa é a forma de salvar os nossos jovens. Vejam isso, vejam o que está acontecendo aqui, quantos jovens estão sendo salvos pelo movimento Hip Hop, vale muito à pena investir nisso”, considerou. 

(25.nov.23) - Público assiste apresentações na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Público assiste apresentações na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

Negalu também reforçou que o novembro é um símbolo de luta de pessoas que lutam o ano todo. “A gente é preto o ano inteiro, o beat de novembro é bem simbólico, porque a gente é preto ano inteiro, desde quando acorda e quando dorme, então novembro é só simbólico mesmo, é bem simbólico”.

PRODUÇÃO FEMININA

(25.nov.23) - Equipe da Afronta. Jéss ao microfone. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Equipe da Afronta. Jéss ao microfone. Foto: Tero Queiroz 

Uma das realizadoras do Afronta, Jéssica Cândido (Jéss), chamou sua equipe – composta por Camila Maiara, Luciana Ferreira (Negalu), Lua Maria e Muriel Xavier – ao palco, destacando a sua felicidade de estar realizando a noite cultural. “Neste momento eu tô emocionada e muito feliz. Cansada também, mas o cansaço faz parte de todo o esforço. Eu acho que unir todas as cenas, ou o máximo de cenas possível é a preocupação que todo o evento precisa ter, porque eu acho que a vida é muito plural, a gente conseguir reunir tantas pessoas assim, diversas, faz sentido, sabe? Eu quero que cada vez mais que o Afronta seja mais plural, para todos os públicos, representando no palco pessoas pretas, pessoas indígenas, aquelas pessoas que nunca nem se viam no palco, além de pagar os artistas, de gerar renda”, apontou.

(25.nov.23) - Jéss é uma das idealizadoras e uma das organizadoras do Afronta, em Campo Grande. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Jéss é uma das idealizadoras e uma das organizadoras do Afronta, em Campo Grande. Foto: Tero Queiroz 

Jéss reforçou, assim como o público, a necessidade de haver mais eventos com protagonistas negros e negras ao longo do ano. “Assim como todas as pessoas, todos os artistas, a gente não vive só em novembro, é o ano inteiro. Artista quer ser contratado o ano inteiro, independente do mês de novembro, que é o mês da Consciência Negra. Acho que nem precisa falar, é totalmente óbvio que isso aconteça mais vezes e que em novembro também tenha essa valorização, mas que o ano inteiro, independente de quem for, chamem em festa junina, chamem artista preto de samba, de forró, de axé, de rock, de reggae, de arrocha, de tudo, sabe? A gente tem artista preto para tudo e a gente tem que ter oportunidade de ser contratado em todos os espaços, independentemente de qualquer coisa, de qualquer evento”.

A produtora celebrou a oportunidade de poder estar recebendo apoio financeiro do estado, ainda que pequeno, mas que oportunizou que fossem reconhecidas uma gama de artistas e outros profissionais negros. “Para quem não tinha nada, quando a agente vê rolar uma grana de fomento a gente fica: meu deus, o que eu faço? agora tem que ser impecável e a gente sempre tenta ser impecável, o mais honesta possível, para não gerar nenhuma dúvida de nada. Até porque, a gente sabe que rola o show de outras pessoas mesmo, então a gente tentou entregar aí e dar essa empregabilidade para o máximo de pessoas possível, de artistas e tratar da maneira mais honesta. O poder público a gente agradece muito, mas a gente quer que esse seja o início para outros eventos conseguirem acessar essas verbas de apoio, também, para viabilizar esses outros eventos com outras temáticas, com a temática indígena, quilombola, enfim, da cultura preta. Então, eu acho que se esse é o direito de alguns, tem que ser o direito de todos e é isso”. 

(25.nov.23) - Jéss celebrou as conquistas e o grande público presente na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Jéss celebrou as conquistas e o grande público presente na 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

De acordo com Jéss, para conquistar a realização da 5ª edição do Afronta, foi preciso muita insistência e aprendizados em busca do direito de acesso aos recursos públicos culturais. “Quando a gente não sabe, a gente corre atrás e a gente aprende. A gente deu uma apanhada, mas a gente sempre está indo lá, correndo atrás pra, enfim, a gente entregar esse trabalho, não ter problema nenhum e a gente continuar fazendo esse trabalho honesto, transparente, para que no ano que vem a gente venha com mais força ainda. Eu só quero que isso continue, porque a gente está pronta para fazer eventos muito maiores e eu quero agradecer todo mundo que está aqui, cara, pessoas brancas que vieram aqui assistir artistas pretos, assistir pessoas com linguagens pretas e também indígenas e todo mundo que acreditou e acredita na Afronta e sobe no palco, a gente sempre quer trabalhar com cachê, com pagamento porque é a coisa mais justa pra um artista que vai subir em um palco”, completou. 

DUPLA DE APRESENTADORES

(25.nov.23) - Cj e Jéssika Rabello apresentam o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Cj e Jéssika Rabello apresentam o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz 

Os apresentadores da Afronta, foram CJ e Jéssika Rabello. Ambos estavam esplêndidos no palco, incumbidos da missão de anunciar os diversos artistas. 

(25.nov.23) - Cj durante apresentação do 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Cj durante apresentação do 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz 

Para CJ a Afronta ofereceu um momento de valorização a produção de artistas da cultura Hip Hop, dando-os verdadeiro protagonismo. “As artes periféricas que condizem muito com o Hip Hop, que me criou, que me tirou de um contexto de marginalidade, de um contexto de criminalidade e de não existência social, que a cada dia mais tem me trazido esse momento, esse networking e espaços como esses de fala. O Hip Hop, ele nasce dos pretos periféricos. A periferia, que nada mais é que um acumulado de pretos,  de um processo de aquilombamento, que vem da nossa estrutura escravagista, que veio de mais de 400 anos de escravidão no Brasil. O complexo periférico é povoado por pretos e produz muita arte, essa arte é extraída por pessoas da elite, uma maioria branca e ressignificada, ou apenas renomeada, deixando a gente apenas com o contexto de marginalidade, criminalidade e de violência e novamente de invisibilidade e inexistência. Um evento como esse, o Afronta, um evento feito por pessoas pretas, mais do que pessoas, mulheres pretas, com artistas pretos e pretas, uma profissão preta, com seguranças pretos, com todos os meios pretos aqui, diz não só sobre sustentabilidade, sobre sobrevivência, mas também sobre manutenção, sobre organização, sobre visibilidade do povo e da comunidade preta como um todo”, considerou.

(25.nov.23) - Jéssika Rabello durante interação com o público do 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Jéssika Rabello durante interação com o público do 5ª Afronta. Foto: Tero Queiroz 

Apresentadora oficial do Afronta, desde a primeira edição, Jéssika Rabello comentou a diferença entre a apresentação na Orla Morena (local onde aconteceram as outras edições) com o evento na Praça do Preto Velho. “ Lá na Orla é um ambiente pequeno, acolhedor, é um lugar que já recebe algumas batalhas, mas a gente contou com outra estrutura. Tudo o que a gente fez lá foi com pouca estrutura, com pouco apoio, pouco patrocínio e dessa vez não, dessa vez a gente conseguiu uma estrutura maior. A gente conseguiu pagar todos os profissionais que participaram em um lugar aberto, de história, porque aqui é a Praça do Preto Velho, então isso é muito importante sair de lá e ocupar outros lugares. A diferença é ocupar vários lugares diferentes, com palco ou sem palco, com estrutura ou sem estrutura, é a gente ir ocupando. Não é fácil, jamais, mas estamos conquistando”, disse. 

(25.nov.23) - Público assiste a apresentação durante o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - Público assiste a apresentação durante o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz 

CJ explicou que o uso comercial da cultura preta é contemporâneo e que uma das missões do Afronta é problematizar isso. “Cada vez mais o preto é usado com um fim comercial. Hoje é bonito ser preto, antes não era bonito, hoje eu posso usar um turbante, eu posso usar um black power e ainda assim eu reclamo por ser tirado de exótico na maioria dos lugares que eu vá. Apenas por ser o que o meu povo é, eu ainda agradeço por poder existir carregando todos esses traços que eu tenho e ainda assim sendo visto, mesmo que de maneira exótica, como algo a ser alcançado, como algo desejado, como algo almejado. O Afronta, ele tem essa vontade, ele é feito de pessoas pretas porque ele é feito para afrontar, nos dois sentidos da palavra, no sentido verdadeiro de afronta, de quem vai contra, de quem bate de frente, de quem é resistência e também de afronta, colocando afro, usando desse termo, porque nós somos isso, nós somos uma cultura descendente. Cara, eu não sei nem quem é meu vô, eu não sei de onde é o meu povo, eu não sei que tipo de preto eu sou e tudo isso por causa de um apagamento histórico gigantesco e hoje estamos aqui culminando e comemorando e mostrando que o preto é forte e tem força, não só em novembro, ou na semana do dia 20 de novembro, mas o ano inteiro. Nós somos a mão de obra, nós somos o rosto, nós somos a voz, somos o suor e somos o sangue e o poder preto vem ligado com o poder periférico e o poder periférico vem ligado ao pesadelo do sistema e o pesadelo do sistema hoje pode ter meu nome, pode ter o nome desse evento ou de qualquer um dos artistas que passou por aqui”.

(25.nov.23) - CJ e Jéssika Rabello apresentam o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz (25.nov.23) - CJ e Jéssika Rabello apresentam o 5ª Afronta em Campo Grande (MS). Foto: Tero Queiroz 

Rabello considerou quais são os desafios das protagonistas pretas. “Eu acho que a primeira dificuldade a ser levada a sério é que as pessoas banalizam muito o saber das pessoas pretas, a construção científica das pessoas pretas, tanto que a maioria das coisas que cientistas pretos descobrem primeiro é estabelecido por uma pessoa branca, por exemplo. Eu como pedagoga, eu entendo que a gente é formado para a invisibilidade, então a maior dificuldade é bancar o preto diante do visível, tirar ele do escondido. Então, aqui é tudo produzido por preto, o nosso público é preto, os artistas são pretos, então a gente fica visível, é onde a gente ganha atenção. Acho que, assim, a maior dificuldade é as pessoas entenderem que a gente não está fazendo isso porque a gente quer um clubinho, mas é que a gente quer ocupar os espaços igual a todas as outras pessoas”. Ela também celebrou o clima na noite e prospectou os desejos para a próxima edição. “A vitória para esse evento, primeiramente foi a chuva, conseguir com que todos os artistas tenham se sentido em casa, conseguir que criança suba no palco e eu tenho certeza que a vida dela vai mudar a partir de hoje. O acolhimento das pessoas, também, olhar ao lado pra saber que você é uma maioria, porque a gente sempre é uma minoria em vários espaços. Então, aqui a vitória é saber que a gente fez afrofuturismo”. 

Veja a galeria com a cobertura completa do evento: 

FOTOS: TERO QUEIROZ | TEATRINETV -->

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